segunda-feira, 3 de julho de 2017

A Guerrilha de Três Passos




   O golpe civil-militar de 1964 foi, evidentemente, um golpe contra o projeto trabalhista para o Brasil. No contexto de ditadura e repressão que se abateu sobre o país após o golpe, muitos militantes trabalhistas se organizaram com o intuito de resistir.Parte da historiografia brasileira (sempre militante, seja pra esquerda ou para a direita) procura colocar que movimentos guerrilheiros contra a ditadura só apareceram após o AI-5 de 1968. Há, é certo, historiadores vinculados a partidos políticos que procuram sempre apontar a experiência guerrilheira no Araguaia, por exemplo, como a “única” existente. Na verdade, antes mesmo de militantes pensarem em organizar um foco guerrilheiro no Araguaia, grupos trabalhistas, sob a inspiração de Brizola, se organizaram logo nos primeiros meses após o golpe. Foram estes trabalhistas brizolistas que organizaram a guerrilha de Três Passos (RS).
   Os objetivos da guerrilha de Três Passos eram acabar com o regime ditatorial antes mesmo dos militares “comemorarem” o primeiro aniversário do golpe – ou seja, em 31 de março de 1965 – e restabelecer a democracia no país para realizar as Reformas de Base, pregadas por Jango e Brizola. “Entre meados de 1964 e o começo de 1965, todos os planos de insurreição tinham um traço em comum: o levante, a coluna de combatentes, deveria partir da região Sul do Brasil, onde estavam as bases históricas do trabalhismo e o III Exército, responsáveis pelo sucesso da rede da Legalidade em 1961.”
   O grupo guerrilheiro de Três Passos foi liderado pelo coronel Jefferson Cardin Osório, ligado ao Movimento Nacionalista Revolucionário (MNR), e o sargento da Brigada Militar, Albery Vieira dos Santos. “À época do golpe de 1964, o coronel Cardim trabalhava como assessor técnico do Lóide Brasileiro em Montevidéu, e o segundo-sargento Alberi, da Brigada Militar do Rio Grande do Sul, fugiu para o Uruguai. No ambiente de conspiração dos exilados no Uruguai, Cardim destacava-se porque, à revelia de muitos planos e estratégias, dizia a interlocutores que não admitia que o golpe de 1964 completasse um ano sem que houvesse qualquer reação. O trajeto escolhido para a coluna de combatentes, que subiria pelo noroeste do Rio Grande do Sul até Mato Grosso, deveu-se ao conhecimento que o sargento Alberi tinha da região, e também por ser uma área fronteiriça, que margeava a Argentina e o Paraguai, proporcionando rotas de fuga.”
   Além destas duas lideranças, também comandou o grupo o professor Valdetar Dorneles, ligado a um núcleo de “Grupo dos Onze”. Em entrevista à Rádio Legalidade, no dia 27 de março, Valdetar afirma que muitos setores da esquerda não reconhecem a guerrilha da qual participou e após a “anistia” de 1979, teve a sua recusada! Juntos, eles formaram o Movimento 26 de Março (M-26) – o nome foi escolhido devido a data prevista para o levante. Após alguns meses de planejamento, os guerrilheiros iniciaram a tomada da cidade de Três Passos. A partir dai eles iriam conclamar os nacionalistas, trabalhistas, socialistas e comunistas à derrubada do regime imposto.
   Na noite de 26 de março de 1965, esse grupo tomou o quartel da Brigada Militar, rendendo os brigadianos de plantão e se apoderando de armamentos e fardas. Em seguida, tomaram o presídio e os meios de comunicação local. “Além de deixar a cidade sem comunicação telefônica, uma vez que cortaram os fios da rede, invadiram a Rádio Difusora e obrigaram, sob a mira de uma metralhadora, os proprietários Benno Adelar e Zilá Breitenbach a colocar a emissora no ar para ler um manifesto contra a ditadura militar.” O manifesto, redigido por Cardim, falava em Forças Armadas de Libertação Nacional.
   Após a tomada de Três Passos, o grupo seguiu para Tenente Portela, onde também tomou um destacamento da polícia militar. Dali seguiram para Santa Catarina. A intenção dos guerrilheiros era chegar ao Paraná, onde Castelo Branco, primeiro presidente da ditadura, iria inaugurar a Ponte da Amizade, que ligava Brasil e Paraguai. Mas a esta altura o exército já estava sabendo do grupo guerrilheiro e uma batalha ocorreu na localidade de Leônidas Marques, no Paraná (há rumores de que havia um informante no grupo que repassava para as forças de repressão as atividades da guerrilha). Valdetar, em entrevista à Rádio Legalidade, lembra da chegada do grupo ao Paraná. Quase 50 anos após este episódio, ele diz que se o grupo tivesse chegado à Foz do Iguaçu poderia fazer com que Castelo Branco fugisse para o Paraguai, do outro lado da ponte, e desta forma o congresso deveria declara-lo “fugitivo” e assim o regime se desestabilizaria. Após esta batalha, o grupo guerrilheiro se dispersou. Aos poucos foram sendo capturados pelo exército e submetidos às mais cruéis torturas.



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