sexta-feira, 3 de abril de 2020

A Colonização Inglesa na América


A ocupação da América do Norte pelos ingleses distinguiu-se da colonização ibero-americana em vários aspectos. Na América do Norte, o processo de colonização ocorreu mais tarde a partir, principalmente, do século XVI – e teve um caráter em grande parte espontâneo. Além disso, as próprias características físicas do litoral norte-americano eram diferentes, por se tratar de uma região não tropical e sem metais preciosos. Na Inglaterra, a rainha Elizabeth I, que governou de 1558 a 1603, estimulou a construção naval e o comércio marítimo, no contexto da política mercantilista. O governo também apoiava outro tipo de presença inglesa no mar: no litoral do Caribe, os corsários ingleses saqueavam os galeões espanhóis repletos de metais preciosos que rumavam para a Europa. Quando a Inglaterra se lançou à conquista colonial, no início do século XVII, o território da América tropical já estava sendo explorado por portugueses e, principalmente, espanhóis. Na América do Norte, era necessário disputar espaço com franceses e espanhóis. Quando os ingleses chegaram, as regiões que hoje correspondem ao Arizona, à Flórida e ao Novo México já eram territórios espanhóis. A criação de companhias de comércio na Inglaterra, nas quais o Estado apoiava a burguesia nacional, fortaleceu o grupo que tomaria a frente no estabelecimento de colônias no Novo Mundo. Além disso, fatores políticos como a derrota da nobreza feudal por Henrique VII e Henrique VIII – e culturais – o desenvolvimento de uma pequena burguesia com forte iniciativa econômica associada ao individualismo espiritual da teologia protestante também foram importantes para a colonização da América inglesa. Como a Inglaterra oferecia poucos recursos para promover a colonização, diferentemente do que ocorreu nas demais regiões da América, esta decorreu fundamentalmente do empenho dessa pequena burguesia. Assim, as colônias inglesas começaram pobres e sem gerar importantes recursos para a metrópole inglesa. As primeiras tentativas colonizadoras ocorreram entre 1584 e 1587, quando foram enviadas três expedições inglesas à América do Norte, sob o comando de sir Walter Raleigh, que resultaram, porém, em grande fracasso, por causa da violenta reação dos povos nativos. Somente em 1607 a fundação da colônia de Virgínia, explorada por uma companhia de comércio que reunia empresários acionistas e detinha o monopólio comercial e da colonização, iniciou uma era de viabilidade econômica para a ocupação e exploração da região.


Um dos estímulos ao fluxo populacional da Inglaterra para a América do Norte, colaborando para seu povoamento, foi o processo de cercamento das propriedades agrícolas inglesas, o que gerou grande excedente demográfico. Expulsas do campo e não encontrando espaço na economia urbana, as vítimas dos cercamentos acabaram rumando para a América. Ao mesmo tempo, os crescentes conflitos políticos e religiosos dentro do Estado inglês estimularam a emigração de protestantes, como os puritanos e os quakers, grupo dissidente dos calvinistas ingleses fundado no século XVII. Ao enfatizar a soberania de deus e a dependência do homem, o puritanismo (apenas com um pouco mais de energia do que o protestantismo em geral) chocava-se de frente com o espírito moderno de otimismo e individualismo confiante. ainda as sim, ao mesmo tempo, o puritanismo imprimia um poderoso ímpeto psicológico ao esforço individual. os puritanos eram “atletas morais”, convencidos de que a vida correta era a melhor prova (embora não garantia) de que o indivíduo desfrutava a graça de deus. A vida correta incluía trabalhar tão arduamente e ser tão bem-sucedido quanto possível em qualquer ofício mundano e negócio em que deus houvesse colocado a pessoa. animados por essas convicções, não era de admirar que os puritanos fossem altamente vitoriosos em suas atividades temporais, em especial nas circunstâncias favoráveis oferecidas pelo ambiente do novo mundo.



Na região da Virgínia, os primeiros núcleos de produção inicialmente se dedicaram à obtenção do tabaco, produto largamente consumido na Europa. Mais tarde, também foram produzidos corante índigo (anil), arroz e algodão. Além da Virgínia, outras colônias se transformaram em grandes centros de produção agrícola, como Geórgia, Carolina do Norte, Carolina do Sul, Maryland e Delaware. Essas colônias situadas ao sul do território inglês da América do Norte têm sido consideradas genericamente colônias de exploração, assemelhando-se às colônias portuguesas, no sentido de terem se fundado economicamente no regime de plantation latifúndio monocultor, baseado em trabalho escravo e cuja produção estava voltada para o mercado externo). A colonização dos territórios mais ao norte (atuais estados de Nova Jersey, Nova York, Pensilvânia, Connecticut, Massachusetts, Rhode Island e New Hampshire) teve, entretanto, características bastante diferentes. Nessa região, concentrava-se boa parte dos colonos que sofriam perseguição religiosa na Inglaterra. O primeiro grupo desembarcou do navio Mayflower em 1620 e fundou a cidade de Plymouth, em Massachusetts núcleo inicial da Nova Inglaterra, assim chamada porque pretendia reproduzir as condições de vida da pátria dos colonos. Mais tarde, a Nova Inglaterra participou do comércio triangular entre a América, a Europa e a África: ali os comerciantes fabricavam rum, a partir do melaço obtido nas Antilhas, para trocar por escravos na África e vendê-los nas colônias de exploração do sul e nas colônias do Caribe.


Nas décadas seguintes, novas colônias próximas a essas foram fundadas, caracterizadas pela pequena e média propriedade e pela produção para subsistência da comunidade de colonos e para o mercado interno, distinguindo-se daquelas mais ao sul. No início, havia grande pobreza nas colônias do norte, pois a população mal conseguia produzir o suficiente para se manter. Porém, no longo prazo, a chegada constante de novos imigrantes e o predomínio do trabalho livre acabaram por criar um mercado consumidor local, impulsionando a produção de diversos produtos. É importante observar que não se pode fazer uma classificação rígida entre colônias de povoamento e colônias de exploração. Assim como na América ibérica, houve nas diversas colônias da América inglesa iniciativas de formação de núcleos de povoamento, nos quais a produção estava voltada para o consumo interno, e também atividades em que se utilizava mão de obra escrava e cuja produção estava voltada para o mercado externo. A grande diferença entre ingleses e ibéricos em seus domínios americanos consistiu na forma como as Coroas metropolitanas se impuseram no processo de colonização. Diferentemente dos espanhóis e portugueses, a Coroa britânica não exerceu uma fiscalização colonial intensiva no século XVII, em boa medida por causa de conturbações políticas internas. Sem um forte controle tributário, os colonos da América inglesa puderam dedicar-se a várias atividades produtivas e desfrutar de liberdade econômica e religiosa. Mantendo poucos laços políticos e econômicos com a Inglaterra, as colônias do norte desenvolveram uma produção manufatureira e um comércio cada vez mais intenso e diversificado. A construção naval progrediu, tornando possível maior articulação entre as colônias, obtenção de itens externos e até comércio de longa distância, que envolvia o Caribe, a África e a Europa (veja o mapa abaixo). O controle intenso sobre a colônia, tão característico do colonialismo ibérico, não esteve presente na colonização inglesa da América do Norte. Desde sua fundação, jamais houve um efetivo projeto normativo inglês de colonização. Ao mesmo tempo, os intensos conflitos políticos internos na Inglaterra do século XVII, como a Revolução Puritana de 1641, a posterior guerra civil e a Revolução Gloriosa de 1688, contribuíram para afrouxar os laços de dominação. Na verdade, já existia certa autonomia econômica e política, pelo menos entre as colônias da Nova Inglaterra. Mais tarde, no século XVIII, a monarquia liberal inglesa assegurou estabilidade política ao país e a Inglaterra emergiu como potência mundial. Nesse momento, buscou-se uma redefinição do papel das colônias, sujeitando-as a uma política fiscal inglesa e impondo o fim de suas liberdades comerciais e políticas. Os conflitos daí gerados culminariam no processo de independência das Treze Colônias inglesas na América do Norte.




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